sexta-feira, 21 de outubro de 2016

EU FALO DE... ANTOLOGIA DO SILÊNCIO

Saibam mais do livro neste link

Confesso que não sou apologista, nas análises que faço aos livros que leio, à identificação das correntes literárias onde, porventura, esses mesmos livros possam ser encaixados. Só não assumo essa inabilidade como «aversão» porque a definição do termo, nos dicionários de língua portuguesa, reporta para o ódio/repugnância e, no meu caso, é mera antipatia pela tarefa por acreditar que esse género de análise tem mais sentido quando feita dentro de perspectivas académicas. Eu limito-me a identificar aquilo que considero boa ou má escrita, respeitando sempre as minhas próprias definições e parâmetros de qualidade. Faço esta confissão como alerta para os mais "literais" que, muitas vezes, não entendem o alcance do que escrevo, dando-lhe conotações excessivamente clássicas. Não tenho essa pretensão!

Serve o parágrafo anterior para justificar a distinção que faço entre o romantismo como corrente literária, onde se inclui a generalidade dos autores da modernidade (mesmo sem o saberem), e o romantismo enquanto forma de discurso de carácter sentimental (usado até à exaustão pela quase totalidade dos autores de hoje).

Posto isto, quero falar-vos do livro ANTOLOGIA DO SILÊNCIO de Susana Inês que considero apropriado ser incluído no universo do romantismo, que não a corrente literária, embora tenha as características ideais para também o ser.

Não sendo um grande livro (nem mesmo no tamanho) é um bom manual de como escrever sobre sentimentos de um modo distinto da norma. Enquanto a maioria faz uso abusivo de clichés e discursos insossos e pouco originais, a autora deste ANTOLOGIA DO SILÊNCIO consegue fazer uma abordagem mais imagética com recurso a instrumentos linguísticos que raramente vemos serem utilizados, nomeadamente as figuras de estilo. Exemplo perfeito do que acabo de referir pode ser observado logo no poema inicial:

PORTA DE ENTRADA

Na minha porta de entrada
Há sempre uma vista
Para uma janela
Mais súbita e intensa,
Para um sonho mais sábio
Que aspira à sarça da confiança.
E se a realidade
não for aquela que se deseja,
a porta de entrada
verá a janela do Presente
e se a janela não bastar
o Sol desvenderá, ao longo da estrada
a chave para aflorar
o sorriso da gente.

ou ainda, mais adiante:

MÃOS DE SOL

Encaras a vida com armas de brilho,
Braços de árvores e mãos de Sol.
Digeres as palavras
Como se te alimentasses
Somente delas e da Alma que elas te trazem.
A seiva, o oxigénio, a vida,
A explosão acesa em cada cítara
Que ouves harpeando no eco do teu cogitar,
É a certeza gradual que contempla
O compasso da melodia
Que escutar-se-á além-mar.

e a componente romântica:

RECOLHER

O recolher imprevisto
Do beijo que tocou
O começo da noite,
Onde a ânsia não se aquieta.
As mãos prenderam mas não disseram
Mais nada que não a dimensão do gesto!

E mais exemplos poderia dar mas correria o risco de transcrever integralmente o livro, e não é isso que se pretende.

Creio não estar muito longe da verdade se disser que, com este trabalho, a autora pretendia levar os leitores numa viagem pelos silêncios, que só a palavra escrita nos pode proporcionar. De modo geral pode ter conseguido mas, para mim, a sua grande conquista, senão o maior atributo deste livro, é ter emprestado um enorme cunho de originalidade na maioria dos textos apresentados e, com esse simples acto, provar que ainda há margem de manobra suficiente, para se ser criativo, para todos aqueles que negam entregar-se a uma só fórmula; a uma única abordagem.


MANU DIXIT

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