terça-feira, 25 de julho de 2017

FALA ÁFRICA - MACVILDO PEDRO BONDE

MOMENTO CULTURAL
Ao Luís Carlos Patraquim, Maputo, 13 de Julho de 2017
Entrei sala a dentro e as cadeiras reclamavam a aclamação de quem transporta entre os alvéolos a poética. Dos meus passos tremidos sacrifiquei os ruídos do silêncio para não despertar a malta que escutava as palavras embargadas do dono de Ualalapi. Lancei meus olhares aos assentos para acomodar meus ossos. Tropecei na varanda onde as amizades constroem sonhos diante da margem, onde o verso e a prosa se cruzam.
O sítio continuava com algumas clareiras porque a cidade anda entre homenagens e lançamentos. Parece que o “demónio” do nosso tempo não estava presente “ali” para marcar o seu território nas prateleiras que estendem a sua vasta produção. Khossa na sua parcimónia sangrava episódios de outros carnavais.
Entre conversas e expectativas chegou o momento “cultural”. O trovador junto a seus acólitos cantou na simplicidade do acto a trajectória de um Luís que se metaforiza ao sabor do vinho. Chamo à fala o dono da Rabhia. Que momento é este? Rimos porque já andamos a ouvir, algures, estas sandices.
Do Xipamanine às memórias da urbe, estão as acácias em flor. Os sorrisos fazem-se presentes e esquecemos o episódio ao sabor do discípulo do velho A. Machavele. Meus olhos não deixam de fitar o Luís. Ali estava o poeta calçando os óculos, a idade já a pesar na armadura dos dissabores.
Como cantou o declamador afamado da pérola do índico “morrer é viver, viver é morrer”. Enquanto destilava suas memórias, os papéis iam a conta-gotas assinalando a hora do mestre. Andarilho do mundo, preso às suas convicções, caixeiro-viajante ou viageiro entre os hemisférios, pousou sua boca no microfone como quem abraça os gelados da infância.
Com a erudição que atravessa a língua declara que toda a poesia é de circunstância. A plateia ávida deixa-se embalar pelo ensejo. Com a peculiaridade com que sorve o papel evidencia que as coisas surgem por acaso. Agarrado ao meu telemóvel, rio comigo porque ando aos alaridos na busca desse elixir que me escapa entre os dedos.
Quando dei por mim, a sala bailava com outro olhar, porque os verdadeiros leitores estavam ali compondo os degraus, como disse o poeta “…para fazer chorar as pedras da calçada”.

Breve biografia
M.P.Bonde nasceu a 12 de Janeiro de 1980 em Maputo. Foi membro do projecto (JOAC) e do colectivo Arrabenta Xithokozelo. Em 2017 lançou a sua primeira obra literária “Ensaios Poéticos” pela Cavalo do Mar.

Podem reler o texto que José Manuel Martins Pedro, o nosso correspondente de autores africanos, nos escreveu sobre este autor neste link



1 comentário:

  1. Adorei ler o teu texto. Magnifico e maravilhoso texto, parabéns. Amigo, um documento que valoriza a nossa cultura, Abraços.

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