TEMPO
Regresso
ao meu quintal, o mundo onde os meus amores florescem. Regresso a infância da
minha solidão porque encontro nela a porta aberta para a sopa da mãe, o sermão
do meu pai, as travessuras dos mais novos. Na varanda do quarto há bailes doces
de que aprisionam à minha boca; o peixe seco ofusca o sol que cai no chão do
silêncio. O sofá massageia os corpos regressados do trabalho, encanta os rostos
com a maciez do aconchego, abre as suas cores para os sorrisos que sofrem dos
horrores na hora do jornal; tristes, os olhos cessam o brilho.
Regresso
ao meu quintal porque a luz da madrugada perdeu as estrelas, o soalho é
friorento e as bochechas engordam sem o mastigar das ervas que brotam do
cansaço. Reparo que a mesa nasce triste no olhar do tempo e as mordaças
penetram na angústia da liberdade. Regresso ao meu quintal? Compreendo que as
vozes são sempre solidárias, os carros de arrame sobrevoam nos calos da mão, as
fisgas escondem no burilar do tiro o fim do verão e a alegria esgota na cor do
dinheiro.
Hoje
regresso desterrado com a ausência do calor fraterno, o aconchego dos meninos
que se riem das rugas no berço da vida. O meu quintal é um seio cheio de ouro e
leite na boca; um sopro que invade a solidão.
As
borboletas pousam no pólen das palavras e as flores brilham no coração da
língua. Os verões nascem nos gomos da laranja, azedam as mãos de maldade,
amarram às costas a fórmula do suicídio.
Regresso
como quem janta rebuçados na colmeia do abraço, como quem dorme com Deus no
labirinto do abismo. Hoje aceno a vizinha que tem uma ponte na boca e lágrimas
nas mãos. Regresso a chave da felicidade porque danço no asfalto o sonho que
soneca no bolso.
Regresso
ao quintal como quem já emigrou dentro de si, procurando nos lábios dos filhos
a essência do amor. Ah! Que aromas abundam na casa do meu pai?
Breve
biografia
M.P.Bonde
nasceu a 12 de Janeiro de 1980 em Maputo. Foi membro do projecto (JOAC) e do colectivo
Arrabenta Xithokozelo. Em 2017 lançou a sua primeira obra literária “Ensaios
Poéticos” pela Cavalo do Mar.
Vencedor da 1.ª
edição do Prémio Literário Fernando Leite Couto.
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